Em
nossos dias, quando se fala em Inquisição, a imaginação popular é
imediatamente povoada por cenas horripilantes dos “terríveis”
tempos medievais com suas fogueiras e vítimas inocentes sendo
condenadas injustamente à morte por uma instituição
opressora chamada Igreja Católica. Neste contexto, figuravam os
religiosos impiedosos e cruéis com seus variados instrumentos de
torturas prontos a esfolar qualquer um que lhe cruze o caminho
despreocupadamente.
Assim,
a maioria das pessoas acostumou-se a pensar em Inquisição,
sem no entanto, possuir dela qualquer conhecimento aprofundado, ou
mesmo certificar seriamente se o que aprendeu na escola corresponde
fielmente aos fatos.
É público e notório que esta visão hedionda que povoa a imaginação popular
foi forjada maliciosamente há séculos, especificamente na
Renascença; ganhou força e notoriedade entre os “iluministas”
– embora estes, tenham conservado um certo limite no repertório de
mentiras elencadas contra esta instituição – e se impregnou nas
mentes através de repetições exaustivas ao longo de mais de cinco
séculos.
Mas, foram de fato a crueldade e a intolerância as forças motrizes deste tribunal tão odiado chamado “Santa Inquisição”? Eis uma pergunta que deveria nos deter nos umbrais desta questão, antes de repetir tantos chavões que nascem antes da ignorância do que de qualquer conhecimento real do assunto. A vida de tantos inquisidores da estatura moral de um São Domingos de Gusmão; um São Luís Bertran; um S. Pio V e tantos outros nos mostram um outro lado da inquisição que foi omitido nas aulas de história.
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O
espírito da Inquisição nasceu de nobres ideais e de uma
preocupação legitima da época (que veremos mais adiante). E um
destes ideais, tão caro ao homem medieval, era o amor à verdade.
Foi este ideal que animou a conduta de muitos destes homens tão
difamados, que no entanto, mereceram a honra dos altares.
Os
inquisidores não agiam impulsivamente, condenando a torto e a
direito qualquer um. Havia uma regra de conduta fundada na lei
evangélica e nos ensinamentos dos santos a guiá-los, e quaisquer
transgressões destas regras, acarretavam graves punições ao
inquisidor. Uma síntese destas regras de conduta se encontra no
Manual do Inquisidor de
Bernard de Gui (considerado um dos mais rígidos inquisidores, viveu
séc. XVI). Nele se diz:
“O inquisidor deve ser diligente e fervoroso no seu zelo pela verdade religiosa, pela salvação das almas e pela extirpação da heresia. Em meio as dificuldades permanecerá calmo. Nunca cederá à cólera, nem à indignação. Deve ser intrépido, enfrentar o perigo até a morte; todavia, não precipite as situações por causa da audácia irrefletida. Deve ser insensível aos rogos e às propostas daqueles que o querem aliciar; mas também não deve endurecer o seu coração a ponto de recusar adiamentos e abrandamentos das penas, conforme as circunstâncias. Nos casos duvidosos, seja circunspecto; não dê fácil crédito ao que parece provável e muitas vezes não é verdade; também não rejeite obstinadamente a opinião contrária; pois o que parece improvável, frequentemente acaba por ser comprovado como verdade. O amor da verdade e a piedade que devem residir no coração de um juiz, brilhem nos seus olhos, a fim de que suas decisões jamais possam parecer ditadas pela cupidez e crueldade”.(cf. Prática VI, Douis 232s).
Estas
exigências de que fala acima “o manual do inquisidor” foram
marcantes na vida dos verdadeiros símbolos do espírito que guiou a
inquisição, tal como: S. Domingos de Gusmão (a personificação
dos verdadeiros ideais da Inquisição) S. Pio V, S. Pedro de Verona,
S. Raimundo de Peñafort, S. Pedro Arbués, S. Turíbio de
Mongrovejo, S. Luis Bertran e tantos outros homens santos que
integraram estas egrégias fileiras, além de outras figuras notaveis
da cristandade, que apoiaram a Inquisição como Sto Antônio de
Pádua, S. Boaventura, Sto Tomás de Áquino, S. João de Capistrano,
S. Roberto Belarmino, S. Fidelis de Sigmaringen e a lista vai longe.
Evidente
que, como em todas as instituições humanas a Inquisição
teve seus pontos falhos, mas querer reduzir a conduta de toda uma
classe a partir de uma pequena parcela de seus membros corrompidos é
absurdo! Não se faz isso com a medicina, apesar de seus maus
médicos; não se faz isso com a arquitetura, apesar de seus maus
arquitetos e, não se faz isso com o direito apesar de seus maus
juristas. Se por um lado, a Inquisição teve as figuras perversas de
Torquemada, Conrad de Marburg, Bernard de Gui, por outro lado, teve
as figuras angelicais de S. Domingos de Gusmão, S. Pio V, S. Pedro
de Verona, S. João Capistrano, e tantos outros santos cujos nomes
são omitidos da lista de inquisidores, para se lembrar só dos maus.
É como se contassem a história dos apóstolos a partir
da biografia de Judas Hiscariotes.
Mas,
felizmente, a nuvem negra que paira sobre a história da inquisição
começa a se dissipar. Em 1998, no Vaticano, ocorreu o grande Simpósio
Internacional sobre a Inquisição, reunindo 30 renomados
historiadores sob a direção do autorizado pesquisador Agostino
Borromeo, para o maior estudo sobre a Inquisição já feito. O
resultado do simpósio nos legou um documento de quase 800 páginas,
que é leitura obrigatória para todo aquele que se põe a pontificar
a respeito deste tema.
O
simpósio descobriu uma realidade bem diferente do que nos foi
ensinado em tantos séculos de deturpação ideológica. Segundo os
dados sobre o mais caluniados dos tribunais da Inquisição: o
espanhol, abolido em 1834. Os registros dos processos indicam que de
1540 a 1700, foram celebrados 44.674 juízos por tribunais
inquisitoriais, sendo condenados apenas 2% (mais precisamente, 1,8%)
das pessoas julgadas; outros 1,7% foram condenados em contumácia, ou
seja, não foram justiçados pessoalmente, mas em lugar delas foram
queimados ou enforcados fantoches. Um número “insignificante”
perto dos estragos perpetrados por comunistas e jacobinos em suas
revoluções.
Porém,
contrapondo-se a conclusão unânime deste grande Simpósio, muitos,
obstinados no ódio à Igreja, desprezam suas conclusões, e
continuam a crer piamente nas fontes duvidosas dos séculos XVI,
XVII, que nunca passaram por um exame apurado. Questionam a conclusão
dos especialistas, mas são incapazes de questionar as versões
históricas infundadas que absorveram passivamente.
A
necessidade da Inquisição
Antes
de analisar o tribunal da Santa Inquisição, deve-se analisar a
justiça penal que a antecedeu. Assim como, antes de se analisar um
fato histórico se analisa o contexto e a mentalidade que a gerou. Se
não, corre-se o risco de julgar o passado à luz do presente, e
assim, cair em grave anacronismo.
No
mais, outros valores regem nossa sociedade, totalmente opostos aos
que regiam a Idade Média. Em nossa época, impera nas mentes e nos
corações o materialismo, o hedonismo, o relativismo etc. Enquanto, na Idade Média o povo tinha fé num Deus onipotente, justo e amoroso. Portanto,
lida-se com fatos de outra natureza mental, totalmente estranhos a
nossa mentalidade. Logo, para compreender tal universo cultural,
devemos nos inserir num clima religioso, caso contrário, não se poderá
julgar adequadamente os fenômenos da época. O mesmo ocorrerá com
os historiadores do futuro que julgarem a nossa época. Deverão se
transportar a nossos valores e nossa cosmovisão para nos entender.
****
O
advento da Inquisição representou um grande avanço para a justiça
criminal da época. Uma visada sobre a Europa pré-cristã, onde
predominava a barbárie dos costumes, nos faz entender o porquê
desta afirmação.
Um
dos exemplos de diversões dos povos romanos era o circo, não o
circo nos moldes atuais, mas o circo em que se exibiam como atração
principal: pessoas sendo trucidadas por feras. Outro exemplo de
espetáculo da época, era a crudelíssima luta de gladiadores que
atraía multidões às arenas. Isso fazia parte do contexto anterior
a cristianização da Europa.
Entre
os germânicos, tais episódios ainda eram mais escabrosos. De modo,
que não mencionaremos para não ser demasiadamente chocantes, embora
– tais episódios, sejam bem conhecidos. Se uma sociedade se
divertia através de selvagerias, imaginemos como punia seus
criminosos!
***
Naqueles
tempos, todos os crimes tinham punições severas – na maioria dos
casos, penas físicas –, que eram aplicadas em praça pública para
o deleite das turbas insandecidas, principalmente quando se tratava
de prostitutas e ladrões.
Os
blasfemadores, por exemplo, tinham os lábios superiores ou
inferiores cortados, ou a língua arrancada; os ladrões tinham as
mãos decepadas ou queimadas. Mas isso tudo não se comparava a uma
pena aplicada na Itália, onde o condenado sofria um suplício
hediondo por quarenta dias. Neste suplício, a cada dia, o condenado
tinha uma parte do corpo arrancada até seu definitivo expirar. Além dos terríveis e injustos ordálios que vigoravam na cultura
germânica.
Penas
como estas predominavam naqueles tempos da Europa pagã e,
naturalmente, no caráter daquele povo estava impresso uma
insensibilidade insensata que não se comovia com os suplícios dos
condenados, antes se compraziam em assisti-los. Em suma, a lei de
Talião vingava e prosperava na Europa.
Sem
falar da clássica “justiça com as próprias mãos” que no mais
das vezes, era a forma mais comum de se fazer justiça naqueles
tempos. Imaginemos o caos em que estava imersa aquela sociedade!
O
cristianismo sendo um fator de unidade do Estado, teve a incumbência
de colocar ordem naquele caos. Porém, esta intervenção demorou a
ocorrer.
E
a desordem se generalizou quando o direito romano consagrou os crimes
contra a fé, como crimes de lesa-majestade divina, que daí por
diante, passaram a ser punidos com todo o rigor da lei civil.
O
imperador Frederico II, também promulgou uma série de penas contra
os hereges – entre elas, a condenação à fogueira – que muito
agravava a condição dos acusados de heresia. E isto, não porque
Frederico fosse um zeloso católico, mas porque via na heresia um
grave distúrbio da ordem social.
Também
não havia naquela época a prisão para os criminosos, esta pena foi
inicialmente aplicada pela Igreja para salvar da crudelíssima morte
muitos inocentes. Os cárceres eram as celas dos mosteiros, onde o
criminoso ficava recluso para pensar suas culpas e fazer penitências
por elas.
Após
esta rápida visada pelo contexto medieval que antecedeu a
Inquisição, nos perguntamos: Como se pode falar da Inquisição e
ignorar todo este contexto hediondo que a precedeu? A brutalidade que
o Império Romano e os povos germânicos puniam seus criminosos? Como
ignorar esta realidade tão cruel que a Inquisição veio extirpar?
Analisar
um episódio de um longínquo passado, e ignorar o ambiente e a
situação que a motivou é um despautério imperdoável a um historiador, no entanto, foi
assim que se ensinou a história em nossos dias. Ensinou-se com o
mesmo ódio anticlerical com que se deturpou a História. Ora, porque
a justiça do Império Romano, e mesmo a justiça germânica, tão
atrozes, são isentas destas afrontas que sofre injustamente a
Inquisição?
Portanto,
é imprescindível lembrar que a Inquisição foi produto de um tempo
muito diferente da nosso. E na época, significou o maior avanço do
Direito Penal. De forma muito sucinta, o historiador protestante, e
inimigo declarado da Igreja, Henry Charles Lea, analisou desta forma
o tribunal da Santa Inquisição:
“A inquisição não foi uma organização arbitraria concebida e imposta sobre o sistema judicial da Cristandade pela ambição e o fanatismo da Igreja. Foi antes o produto natural – poder-se-ia dizer inevitável – da evolução das diversas forças de ação do século XIII […] Os inquisidores se preocupavam muito mais em converter os hereges do que em fazer vítimas”.(LEA, Henry Charles. A History of the Inquisition of the Middle Ages. Vol. I, New York: Harper & Brothers Franklin Square, 1887)
Esta
afirmação tem uma importância singular, tanto pela imparcialidade
do autor – que foi um ferrenho anticlerical – e por sua
indiscutível autoridade no assunto, um dos maiores especialistas em
Inquisição de todos os tempos.
Até
a anticlericalíssima Enciclopédia Iluminista de Diderot e
D'Alembert, reconhecia a desonestidade com que se tratava a
Inquisição:
“Sans doute qu’on a imputé à un tribunal, si justement détesté, des excès d’horreurs qu’il n’a pas toujours commist: mais c’est être maladroit que de s’élever contre l’inquisition par des faites douteux, et plus encore, de chercher dans le mensonge de quoi la rendre odieuse”
(Sem dúvida, imputamos a um tribunal, tão justamente detestado, excesso de horrores que ele mesmo nem sempre cometeu; é incorreto que se levante contra a Inquisição fatos duvidosos e mais ainda, procurar na mentira o meio de torná-la odiosa).(Encyclopédie ou Dictionnaire raisonné des sciences, des arts et des métiers, Tomo VIII edição de 1765, p. 775)
De
fato, como bem diz a Enciclopédia Iluminista, os inimigos da Igreja
se apoiaram incondicionalmente na mentira como forma de demonizar a
Igreja e suas instituições.
***
Após
esta síntese sobre o caótico cenário do sistema criminal antes da
instauração da Inquisição, vamos ao fato que a motivou – já
que além de omitirem o ambiente selvagem que a precedeu, com muita
frequência se omite o que a motivou.
***
Uma
das características dos povos bárbaros que habitavam a Europa nos
tempos medievais, era a fidelidade total a um líder, de modo que, ao
se converter um rei bárbaro ao cristianismo (como aconteceu com
Clóvis) todo o seu povo o seguia nesta adesão; embora, não
acontecia uma adesão formal, mas uma adesão meramente simbólica,
sem que os súditos sigam fielmente os ensinamentos da religião do
monarca.
Inclusive,
o supracitado, Rei Clóvis, a despeito de sua conversão ao
cristianismo, ainda conservou por muito tempo o típico temperamento
que caracterizava os bárbaros.
Conta-se
que certa ocasião lhe narravam a Paixão de Nosso Senhor e, enquanto
descreviam os escárnios e suplícios sofridos por Jesus; Clóvis,
indignado, exclamava cheio de fúria: “Ah, se eu estivesse lá com
os meus francos!”
Assim
aconteceu, durante a conversão dos francos. Que colocaram a
disposição da Igreja seus dotes guerreiros; e desta forma, entravam
em ação sempre qualquer ameaça se apresentava contra a Igreja.
Portanto, para aquele povo brutalizado, qualquer um que atentasse
contra a fé do seu líder, era visto como um grande inimigo, digno
da mais severa punição.
A
Igreja não aprovava tais atitudes e até as repreendia duramente.
Tanto que excomungou os autores de um livro que se afamou na época,
o Malleus Maleficarum, pregando a violência a supostos
hereges. Leão X excomungou Torquemada por seus excessos, e o VI
Concílio de Toledo proibiu terminantemente aos clérigos
participarem dos juízos de sangue, ou seja, aos que implicassem a
pena de morte. Mas era impossível para a Igreja ter um controle
sobre o povo a fim de evitar excessos em defesa da fé.
Os
cátaros
Passemos
agora ao punto saliens da questão: Os cátaros.
Todos
estes pontos supracitados, se agravaram em proporções catastróficas
no século XIII com o despontar de uma estranha e terrível heresia
que provocou grandes distúrbios na sociedade da época.
Eram
os cátaros (do grego Khatarós, puros),
mais conhecidos como albigenses por situarem sua sede na cidade de
Albi, no Lanquedoc (sul da França).
Os
cátaros sustentavam uma estranha cosmologia, onde dois deuses
travavam uma ferrenha batalha pelas almas. Na crença catara, Cristo
teria sido um espírito, semelhante a um anjo, e sua missão seria
conduzir a humanidade ao mundo espiritual. Por outro lado, havia um
Deus mau, criador da matéria, que eles chamavam demíurgo,
conforme a tradição grega; e a este cabia o papel de fazer as
pessoas viverem e amarem a matéria, para assim se perderem nela, sem
jamais encontrar o mundo espiritual.
Neste
universo dualista, o corpo e a matéria seriam o cárcere da alma,
que lutava por se libertar do mundo material a todo custo, e só
assim, alcançar a bem-aventurança eterna no mundo espiritual. Logo,
tudo que era material e tudo que favorecesse a matéria, significava
um triunfo do demiurgo no mundo. Por isso, os cátaros, eram contra a
propriedade privada; o casamento; o sexo e a gravidez. Em suma: eram
contra a própria vida biológica, fonte de onde emanava os males da
humanidade. E neste desvario pseudo-teológico, muitos cátaros
praticavam suicídio em massa, através de jejuns suicidas (endura).
Outra prática revoltante dos cátaros, era o assassinato de mulheres
grávidas e a destruição de plantações inteiras. Isso, segundos
os hereges, para conter o crescimento do reino do demiurgo no
mundo.
Os
cátaros, portanto, eram um perigo não só para a fé, mas, para
toda a humanidade – como eram contra a vida biológica – seu
triunfo no mundo significaria um desastre irreparável ou até mesmo
a extinção da civilização ocidental.
Naturalmente,
esta insana heresia, provocou muitas revoltas no medievo e, muitos
faziam justiça com as próprias mãos diante de tão odiosas
práticas.
A
situação tornara-se tão caótica, que tiveram que recorrer ao
Papa, a autoridade máxima da época, para apaziguar a questão.
O
Papa optou pelo lado diplomático, enviando ao Lanquedoc o
bem-aventurado Pierre Castelnau (1170-1208) para negociar com os
hereges.
Estas
negociações duraram cerca de 20 anos, sem nenhum resultado, até
que Pierre de Castelnau foi brutalmente assassinado pelos cátaros em
1208, o que veio a desencadear uma incontrolável revolta, culminando
em uma cruzada contra os albigenses (1209 e 1244) convocada pelo Papa
Inocêncio III. A Cruzada contra os cátaros durou cerca de 20 anos,
e neste clima de revolta, era comum, simples suspeitas de heresia
terminarem em justiçamento pelo povo.
Com
a situação fora de controle, o Papa Gregório IX (1227-1241)
resolveu intervir, criando o Tribunal da Santa Inquisição
(Inquisitio Hæreticæ Pravitatis) por volta de 1231, (chamada
Inquisição Pontifical)
para investigar e apurar as denúncias de heresias que o povo
fazia antes de se entregar o acusado ao braço secular, que era
encarregado de punir os criminosos.
A
Inquisição trouxe abrandamentos e indiscutíveis avanços ao
direito penal da época. Como por exemplo, o fundamental direito de
defesa ao acusado. O próprio Michel Foucault, autor tão apreciado nos meios anticatólicos reconheceu o papel da Inquisição no desenvolvimento de uma ordem legal. Escreve ele:
"O inquérito foi com efeito a peça rudimentar e fundamental, para a constituição das ciências empíricas; foi a matriz jurídico-política desse saber experimental, que, como se sabe, teve seu rápido surto no fim da Idade Média. É talvez verdade que a matemática, na Grécia, nasceu das técnicas da medida; as ciências da natureza, em todo caso, nasceram por um lado, no fim da Idade Média, das práticas do inquérito. O grande conhecimento empírico que recobriu as coisas do mundo e as transcreveu na ordenação de um discurso indefinido que constata, descreve e estabelece os “fatos” (e isto no momento em que o mundo ocidental começava a conquista econômica e política desse mesmo mundo) tem sem dúvida seu modelo operatório na Inquisição — essa imensa invenção que nosso recente amolecimento colocou na sombra da memória." (Vigiar e Punir)
É
aqui que se ergue outro ponto candente desta história, e que é ao
mesmo tempo fruto da total ignorância por parte dos detratores desta
instituição. Acusa-se a Inquisição de diversos crimes como a
tortura e o assassinato, funções exclusivas do braço secular.
Portanto, ninguém era morto em “autos de fé” como absurdamente
se convencionou afirmar.
A
Inquisição, como seu próprio nome sugere (inquérito), era um mero
tribunal de investigação de crimes contra a fé, portanto, não era
órgão punitivo, mas meramente, investigativo. No mais, em toda a
história nunca se viu tribunal mais clemente que este, salvo alguns
poucos casos particulares em que o poder eclesiástico foi usurpado
pelo poder civil.
O
réu da Inquisição gozava de tais indultos que não se veem nem nos
tribunais modernos. Um exemplo famoso é o de Alazais Sicrela no ano
de 1250, que recebeu licença para passar uns dias fora do cárcere e
retornar no dia de todos os santos. Alazais ficou sete semanas longe
do cárcere. E isto não foi uma rara excesão, o direito as férias
era comum, além do direito que o acusado tinha, chamado propter
infirmatatem, em que o réu podia sair do cárcere para
tratar-se, caso estivesse enfermo.
Em
geral, eram raros os casos em que o tribunal entregava o acusado ao
braço secular, geralmente o simples arrependimento do acusado
perante o tribunal e a renúncia de seus erros era o suficiente para
sua absolvição. No mais, as penas consistiam em peregrinações,
jejuns esmolas e outros atos de piedade.
Conclusão
Afirmou-se
por muitos séculos que a Inquisição matou milhões, e acreditou-se
piamente nisso, mas esta acusação é tão infundada e absurda que
não resiste ao mínimo questionamento sério e a uma pesquisa
aprofundada. Não resiste as próprias contradições anticlericais,
deixadas nos milhares de livros por eles escritos.
É
espantoso o número de vítimas que fez o comunismo em sua história,
mais de 100 milhões, no entanto esta doutrina é sumamente louvada
em nossas escolas e universidades, e tal louvor parte exatamente, das
mesmas figuras que detratam a Inquisição. A Revolução Francesa
que em um ano matou mais que a Inquisição Espanhola em seis séculos
(1478-1834) é incensada nos meios acadêmicos, a própria
“Inquisição” protestante, com seus horrores insuperáveis é
esquecida pelos livros de história. Por que só se maximiza os erros
da Inquisição? Porque se oculta seu lado positivo? Porque os que
protagonizaram as revoluções sanguinárias e anticristãs foram os
mesmos que escreveram a história.
Assim,
há séculos a história é escrita com a tinta do mais puro
preconceito. De modo, que não recebemos outra visão dos fatos senão
a daqueles que deturparam a história desde a renascença. Mas,
qualquer um que resolver exceder os limites desta visão limítrofe e
odiosa, entrincheirada com slogans e clichês irrefletidos, descobre
uma realidade totalmente diferente do que aprendeu nos livros
anticlericais. Descobre algo a mais além das fogueiras e das lendas
negras; descobre o direito penal moderno nascendo nos tribunais da
Inquisição; descobre santos trajando a toga de inquisidor; descobre
a fé de um povo combatendo com denodo os perigos que ameaçavam os
rumos de nossa civilização .
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