Detalhe da pintura de Murillo |
No século XVII, o já consagrado pintor barroco Murillo apresentou uma tela emblemática, a lactação de São Bernado (1660-1670), inspirado na vida do grande santo cisterciense.
Na famosa tela, a Virgem Santíssima com os seios expostos, jorra seu leite aos lábios do santo.
A obra, inspirada em uma passagem da vida de São Bernardo, evoca o momento de sua convalecencia. Narram seus biógrafos que a Virgem Santíssima, a quem o santo reconhecia como "saúde dos enfermos", lhe apareceu e lhe deu a beber seu leite, que além de restituir-lhe a saúde ainda encheu seus lábios de eloquência. A afamada eloquência de Bernardo inclusive lhe granjeou o título de Doctor Mellifluus.
Embora emblemática, a obra não recebeu nenhuma repreensão ou anátema papal; não fora vista como blasfema por nenhum dos grandes moralistas católicos... Um dos motivos para isso, se dá na longa tradição de representações, anteriores a Murillo, da Virgem Lactante. Rechaçar tal representação, representaria também um desprezo a lactação materna. O que seria um absurdo.
Ao se representar a Virgem Lactante, se estava fazendo referência a um simbolismo espiritual de incomensurável grandeza: a Virgem Santíssima é mãe e nutriz da Igreja.
Nas interpretações marianas dos santos, a Virgem Santíssima é chamada de Jerusalém Celeste, onde os fiéis podem ver nela a visão do profeta: "a fim de vos amamentar à saciedade em seu seio que consola, a fim de que sugueis com delícias seus peitos generosos” (Isaías 66, 10-11).
Note-se que a arte sacra, mesmo em suas representações mais emblemáticas, está sempre inserida em um fundamento místico, de alta elevação. Nada é por acaso, e nada é por simples desejo de inserir em uma tendência contemporânea e deslocada de uma realidade espiritual mais elevada.
Eis porque alguns artistas em representações grotescas recebem anátemas enquanto outros, que embora sigam um caminho incomum, recebem fartos elogios.